sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Do rio das flores

Tenho-o desde 2007. É uma primeira edição (nem sei se existem mais) e apareceu na minha vida graças a um "Vou comprá-lo" que deixei escapar em frente aos meus pais. Não ia nada. Era caro! Com aquele dinheiro comprava um vestido, ou uma camisola, ou umas calças.... Mas disse-o em voz alta e os meus pais nunca gostaram de me ver com desejos literários por realizar. Estávamos perto do Natal, por isso tive-o debaixo do pinheirinho.

Nunca o li. E mesmo assim já passou por tantas! Um primo meu riscou uma quantidade deprimente de páginas a lápis de cera cor de laranja. Nada de mais. Continua legível. Servem aqueles rabiscos para me lembrar da consideração que os membros da minha familia sempre tiveram por mim. Mas sempre que penso nisso fico triste. Não pela minha família e muito menos por mim! Mas pelo livro. Que sem nunca ter sido lido já carrega marcas tão profundas de alienamento, de rejeição, de desprezo. Como que amaldiçoado de pura insignificância.

Mas não é assim! Eu quis lê-lo! Tantas vezes que não as consigo contar pelos dedos das mãos. Esteve comigo em alturas muito importantes da minha vida. Mas sempre longe, nunca aberto, nunca explorado. Foi comigo para a praia, para o rio, para o pinhal, para o monte, para o Gerês. Foi comigo para a escola, para a faculdade, foi comigo morar fora de casa. Carreguei-o comigo incontáveis vezes- e olhem que ele é bem pesado! - e nunca o li...

Mas já chega. Sempre que o via ali, na minha mesinha de cabeceira, a suportar uma pilha vertiginosa de livros que quero mas que nunca começo a ler, a culpa corroía-me a consciência como um charro!

Hoje levei-o comigo para o comboio e não tive cabeça nem ouvidos para mais ninguém. 7 anos depois vou finalmente ler, do início ao fim, com total exclusividade e dedicação, o Rio das Flores de Miguel Sousa Tavares.

Ou eu não me chame Catarina Vilas Boas. Leite.

Catarina Vilas Boas

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